quarta-feira, 30 de julho de 2014

ARTE LITERATURA

"Porque a arte faz o homem acreditar em si mesmo. E se sentir melhor. A arte engrandece o homem." Bernardo Carvalho (Livro: REPRODUÇÃO)

Viva a ARTE LITERATURA!!!


DIVERSIDADE

"[...] a diversidade é um reservatório de adaptabilidade. Quanto mais diferença houver, mais chances de nos adaptar ao inesperado." Bernardo Carvalho (Reprodução)

segunda-feira, 28 de julho de 2014

ESPELHOS - EDUARDO GALEANO

Os espelhos estão cheios de gente,
Os invisíveis nos veem
Os esquecidos se lembram de nós
Quando nos vemos, os vemos
Quando nos vamos, se vão?
(In: Espelhos - Galeano)

INCÓGNITA

Conheci Bach muito cedo. E Mozart e Beethoven e Haydin e Chopin e Schubert. 
Não. Não descendo de uma família culta. Tampouco de dotes. Dos doze filhos do meu avô, apenas dois fizeram o curso superior. A outra parte, tirando as duas gêmeas caçulas que terminaram o colegial (como era chamado na época) e tio Daniel que entrou para o “tiro de guerra” e terminou também, os outros aprenderam a ler e escrever. Estava bom para uma família que precisava arar a terra incansavelmente para sua sobrevivência.
 Na infância, nunca entendi bem o que significava a palavra reencarnação, entretanto algo me dizia desde sempre que o tio Daniel era uma reencarnação de Bach. Os grandes clássicos da música me foram apresentados por ele. Sentávamo-nos em seu quarto para ouvi-los. Eu, pelos idos de 9, 10 anos. Eram grandes vinis com capas extraordinárias. Enquanto ele punha aqueles bolachões pretos na vitrola, eu viajava olhando as capas dos discos. Um deles, como se estivesse diante de meus olhos agora, trazia um encarte diferente dos outros, por ser duplo. Com páginas de ilustração, meus olhinhos infantis adentravam aquelas paisagens antigas e me punham dentro dos quadros. Meu tio se sentava a um canto, eu em outro. Em silêncio, ficávamos ali por longos minutos ouvindo aquele som que me soava tão familiar. De onde? Olhávamo-nos às vezes entre uma nota mais curta e outra mais longa ou mais cheia ou mais pausada. Quando todos os instrumentos paravam e apenas um tocava, sorríamos um para o outro. Era um riso de delícias. Ele parecia voar com as notas. No fundo, apesar de nossas companhias silenciosas, sabíamos que éramos dois solitários. Tio Daniel e toda carga clássica que trouxe na alma foi anulado pela religião. Sufocado em regras que fizeram dele apenas um, entre tantos iguais que tocam a mesmíssima coisa em um templo. Minha admiração por ele não era só porque ele punha exatamente o que eu amava ouvir, mas porque tocava também acordeão, piano, violão, violino e sabe-se lá o que mais tocaria se pusessem nas mãos dele. Para compensar a nulidade em que se transformou como Ser, fabrica instrumentos nos fundos de sua casa, sob encomenda. Violinos, violoncelos de primeira qualidade. A tristeza que me toma agora é porque ouço a 9ª sinfonia de Beethoven e imagino ele munido de qualquer instrumento fazendo isso ou mesmo regendo essa orquestra que toca agora. Não sei se ele foi feliz algum dia. Ou se será. Vive uma crise constante de ansiedade que lhe provoca trancos no coração clássico que carrega, que uma hora não suportará mais ser reprimido por tantos anos e parará deixando para trás toda uma vida de música que poderia ter sido e não foi.
Queria não me lembrar, mas como considera Gaston Bachelard,  “a memória é um campo de ruínas psicológicas, um amontoado de recordações. Toda a nossa infância está por ser reimaginada. Ao reimaginá-la, temos a possibilidade de reencontrá-la na própria vida dos nossos devaneios de criança solitária.”

Não fôssemos seres solitários desde muito tempo, talvez ele tivesse se encontrado e eu também nesta larga vida que nos aponta tantos caminhos. Hoje conheço bem o significado da palavra reencarnação, mas não acredito nisso e em quase nada mais. Contudo, confesso, tio Daniel será uma incógnita para mim até que eu feche para sempre os olhos.


sexta-feira, 25 de julho de 2014

DISCÍPULA DA VIDA

"Não tenho tempo para choradeira, o agora urge. Tenho que pisar pedras como se fossem pétalas", disse a uma amiga. Ela riu. Rimos. 
Quando parece que posso prostrar-me e finalmente jorrar todo líquido quente preso no canal lacrimal, vem outra pancada da vida avisando: "Levanta-te e anda! Você não tem fé e caminha sozinha. Portanto faça valer cada minuto nesta carne que compõe seu corpo esquálido e falível." Sou carne, mas preciso caminhar como se fosse composta por pedras. 
Levanto-me, então, e ando como uma verdadeira discípula da vida. Desta que não nos permite outra chance.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

ÉRAMOS DEUSES ATÉ QUE NOS CONHECERAM

Sinto um desejo enorme de escrever um texto sobre pessoas ou uma cúpula que se pareciam deuses antes de serem conhecidas. É realmente asquerosa a forma de poder que alguns conseguem exercer sobre os mais frágeis. Seriam imortais, caso um ou outro não enxergasse a nojenta face por trás das máscaras que carregam. Sob as máscaras, vácuo, vazio, oco. Falta. No fundo, esses imortais são tão fracos e vulneráveis, que qualquer palavra mais pesada consegue atingir seu âmago, chegando não só às suas cascas, mas a seus íntimos todos. Ferem o outro para se sentirem melhores. Assim conseguem aliviar seus egos da falta de amor próprio.
Sem nomes. Sem identidades. São ninguém sem os créditos de seus séquitos indefesos.
Faltam-me palavras. Vazio. Oco. Vácuo. Nada. Falta.
Um texto um dia poderia nascer. O título já brotou.
Quem sabe um dia...

terça-feira, 22 de julho de 2014

GAZA NÃO É FEITA DE HAMAS


Muitos judeus foram assistir, satisfeitos, à condenação de Cristo há dois mil anos.
Milhares de judeus sucumbiram no holocausto aterrorizante de quarenta e cinco.
Alguns judeus hoje juntam-se, no alto de um morro,
para apreciarem os bombardeios em Gaza nos fins de tarde.
De geração em geração, judeus repetem o jugo de perseguirem
e serem perseguidos.
Aprende-se a intolerância com os pais.
A intolerância é herança. Triste herança!

"[...] se os verbetes do meu avô podem ser resumidos na frase como o mundo deveria ser, que pressupõe uma ideia oposta do mundo como de fato é, eu duvido que meu pai não soubesse disso antes da leitura do texto: que para o meu avô esse mundo real significava Auschwitz, e se Auschwitz é a maior tragédia do século XX, o que pressupõe a maior tragédia de todos os séculos, já que o século XX é considerado o mais trágico de todos os séculos, porque nunca antes tanta gente foi bombardeada, fuzilada, enforcada, empalada, afogada, picada, eletrocutada antes de ser queimada ou enterrada viva, dois milhões no Camboja, vinte milhões na União Soviética, setenta milhões na China, centenas de milhões somando Angola, Argélia, Armênia, Bósnia, Bulgária, Chile, Congo, Coreia, Cuba, Egito, El Salvador, Espanha, Etiópia, Filipinas, Haiti, Honduras, Hungria, Índia, Indonésia, Irã, Iraque, Líbano, Líbia, México, Mianmar, Palestina, Paquistão, Polônia, Portugal, Romênia, Ruanda, Serra Leoa, Somália, Sri Lanka, Sudão, Tchecoslováquia, Tchetchênia, Tibete, Turquia e Vietnã, cadáveres que se acumulam, uma pilha até o céu, a história geral do mundo que é tão somente um acúmulo de massacres que estão por trás de qualquer discurso, qualquer gesto, qualquer memória, e se Auschwitz é a tragédia que concentra em sua natureza todas essas outras tragédias também não deixa de ser uma prova da inviabilidade da experiência humana em todos os tempos e lugares - diante da qual não há nada o que fazer, o que pensar, nenhum desvio possível do caminho que meu avô seguiu naqueles anos, o mesmo período em que meu pai nasceu e cresceu e jamais poderia ter mudado essa certeza." (DIÁRIO DA QUEDA - MICHEL LAUB - p. 133/134)



domingo, 20 de julho de 2014

INSONE

Ah, se da insônia brotassem ideias...
Mas não. É cruel.
Está na sua essência ser.
Há algo de insano na insônia.
Proíbe-nos de sonhar e rouba-nos 
todas as brilhantes ideias
as quais corremos atrás
 todos os dias.
"A insônia não é a falta de sono,
é o excesso de ansiedade."

A SOCIEDADE DO ESPETÁCULO

Viva o grande mestre Galeano.

sábado, 19 de julho de 2014

BICHOS

"O animal dentro de nós não tem rosto."
Desconhecemo-nos todos os dias...

sábado, 12 de julho de 2014

FELICIDADE

"Mas a neblina é um pouco como a felicidade, 
só se vê de longe, 
nunca de dentro."
J.P. Cuenca

segunda-feira, 7 de julho de 2014

NORMOSE

"Normose, a doença da normalidade. Pode ser definida como um conjunto de normas, conceitos, valores, estereótipos, hábitos de pensar ou de agir, que são aprovados por consenso ou por maioria em uma determinada sociedade e que provocam sofrimento, outras doenças e morte. Uma pessoa normótica é aquela que se adapta a um contexto e a um sistema doente, e age como a maioria. É um sofrimento, a busca da conformidade que impede o encaminhamento do desejo no interior de cada um, interrompendo o fluxo evolutivo e gerando estagnação." (Site: Pragmatismo Político)

É necessária uma avaliação diária para ter a certeza de que ainda não foi acometido por essa doença horrível. 
Ps: É contagioso... Para quem está sem imunidade, claro...



PARADOXO

“Não se pode regular sua vida pela procura do bem, 
a felicidade de um será sempre a infelicidade do outro.” 
Tzvetan Todorov 
MAKTUB, creio eu...

sábado, 5 de julho de 2014

CONVENÇÕES

As convenções são nojentas.
Pensamentos mumificados.
Patologia coletiva.
Visão neutralizada.
Mundo sem cores.
Desejos não vividos.
Doença. "Mal desnecessário".
As convenções interrompem,
Matam sonhos.
Violentam a fantasia.
Atropelam quereres.
Quadrado. Gaiola.
Cárcere. Caminhos fechados.
A vida é breve demais
para que a preenchamos
com convenções.

Como disse o poeta:
"As convenções são o cancro do mundo."

sexta-feira, 4 de julho de 2014

MORTE AOS ORÁCULOS

Se cada um de nós tivesse um oráculo particular
Poderíamos nos preparar para as temeridades da vida,
Mesmo as piores.
Entretanto, estamos ao sabor do vento
Na brisa de uma vida tão incerta quanto assustadora.
Hoje estou cá, amanhã quem saberá?
"Ainda que eu falasse a língua dos homens e dos anjos",
e soubesse do meu dia de amanhã, eu nada seria.
Ainda que eu tivesse um oráculo particular,
E este quisesse me alertar sobre a vida...
Eu não me bastaria.
Morte aos oráculos!!!


ENTREVISTA: EU NÃO SOU TRAFICANTE

Nos rincões do Paraguay. Entrevista com um jovem rapaz, maltrapilho, sujo, mãos calejadas:
- Há muito tempo você trabalha no cultivo da maconha? - repórter.
- Faz bastante tempo...
- Já o prenderam? A polícia já o levou? - repórter.
- Sim. Me amarraram no pau e perguntaram de quem era a plantação, quanto tinha, como levava, eu era "de menor"...
- E você respondeu? - repórter.
-Não. Não podia falar. 
- O que você acha que aconteceria se tivesse dado as informações sobre o patrão? - repórter.
- ... Aí ficaria difícil, né? - Eufemismo para a morte.
- Você se considera traficante? - repórter.
- Sou não. Sou um trabalhador como outro qualquer na roça. Traficante é quem tem o dinheiro. Eu só trabalho. Não sou traficante!
Essa afirmativa nos põe em reflexão. Se não fosse ele a cultivar, seria outro trabalhador pobre que também receberia uma miséria em troca do trabalho árduo de plantar, colher, secar, embalar e deixar tudo pronto para o despacho. Como em uma roça de fumo. Traficante é aquele que fica com o grosso dinheiro oriundo do comércio disso. Ele é um trabalhador apenas, nada mais.




O DUPLO

- Eu te desconheço!" - ela ouviu de repente.
"Desconheço as duas pessoas que moram dentro de você...
Como podem habitar dois seres tão diferentes dentro de um só ser?"
- Pode! É o monstro humano que alimentamos às vezes. 
Aquele do qual tentamos nos livrar e não conseguimos...
Como se fosse parte integrante de nós. O duplo.
E o único remédio é matá-lo quando não somos capazes 
de nos desvencilhar dele.
E para exterminá-lo, necessário se faz matar os dois.


terça-feira, 1 de julho de 2014

MENTEM-ME...

Mentiram-me. Mentiram-me ontem
e hoje mentem novamente. Mentem
de corpo e alma, completamente.
E mentem de maneira tão pungente
que acho que mentem sinceramente. [...]

Affonso Romano de Sant'anna
A pior mentira é aquela
que contamos a nós mesmos
inúmeras vezes, na vã tentativa
de sofrermos menos.
Mentiram-me e minto-me.