domingo, 11 de abril de 2010

O Pássaro

               Era uma hora da manhã quando ela adentrou a casa do vizinho. Sorrateiramente foi conhecendo o local, onde nunca antes imaginara entrar. Apenas a luz da rua iluminava o quintal, então foi com cuidados tateando para encontrar o motivo de sua invasão. Só silêncio se ouvia sob os ruídos de seus passos.   
              Havia dez dias que essa mulher acordara sob um cantar de pássaro que jamais ouvira antes. Em princípio ficara encantada e foi se acostumando a ouvir pelos dias e noites seguintes o grito da ave que lembrava casa de campo. Deliciou-se fortuitamente por dias, roubando do vizinho esse prazer que só sentem aqueles que têm prazer em se imaginar próximos à natureza.                 
              Agora se via ali, estrangeira, pronta para cometer um crime. Invasão domiciliar. Mas pensava estar cometendo um crime para livrar o vizinho de outro, já que é proibido manter pássaro selvagem em cativeiro, sem devida legalização no órgão de fiscalização. 
             Mas o que a levara a cometer essa sandice, certamente não foi apenas a bondade de libertar um ser da prisão, mas o desejo de tirar do seu vizinho o prazer de possuir algo que ela não poderia.
             Caminhou pelo quintal procurando por uma gaiola ou uma casa de pássaros maior, já que imaginou que esse poderoso cantor deveria ser de grande porte.
            No meio do semibreu, a vizinha criminosa visualizou finalmente algo que poderia ser o procurado que ganharia a liberdade plena de voar. Parou diante daquele objeto grande que parecia uma gaiola, e ouviu então o canto delicioso aos seus ouvidos. Estacou abruptamente ao enxergar em meio à luz da rua, seu vizinho quase desconhecido com um apito que imitava aquele barulho, olhando-a com grandes olhos  de quem pega um marginal em seu delito.