quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

DIGITAL

Dirigi-me ao banco para sacar o resto que ainda havia. Estava quase vazio. Uns dois caixas eletrônicos ocupados e eu. Fiquei a matutar que a crise no país estava realmente fora de controle. Difícil não encontrar fila no banco, mas havia tempo eu não o frequentava, pois meus bolsos também reconheceram a crise.

Entrou um homem alto, barba cerrada, vestido em um esporte fino impecável. Nossos olhares se cruzaram, era um jovem rapaz, notei. Mas rapidamente voltei o olhar para o caixa, na esperança de que esse não me trairia e cuspiria algumas notas que me garantissem a noite.

 O homem pôs-se diante do caixa ao lado. Percebi que estava com certa dificuldade de manusear o cartão, mas não ofereci ajuda. Ele que pedisse, se quisesse. Um rapaz tão jovem e desconhecido dessas tecnologias? Estranhei.

Mas creio que logo se entendeu com a máquina, pois quando me virei para sair, deparei-me com a cena mais grotesca já contemplada pelos meus olhos. Estaquei apavorada, sem voz, sem chão, sem rumo, sem ideia do que aquilo significava. Ele segurava um dedo, que não era seu, no leitor digital do caixa. 

Olhou-me indiscretamente. Viu minha estupefação. Mostrou-me o dedo ensanguentado de alguém e, com um risinho de canto, disse-me apenas:

-- Ela não pôde vir...



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