segunda-feira, 10 de agosto de 2009

AUTORRETRATO


Conheceu um antissemita ainda na infância. Difícil isso para alguém que não sabia sequer o significado da palavra antirreligioso, adjetivo que a si atribuiria quando adulto.

Ouvira tantas histórias sobre espermatozoides (ainda na escola), sem saber da ideia do pecado embutida nesse vocábulo.

Brincara com frequência perto de colmeias, caçara jiboias para sustentar sua autoimagem heroica, pois sonhava trabalhar num projeto que lidasse com paraquedas ou com sistema antiaéreo em guerras. Era tudo ou nada.

Crescera um garoto super-resistente no que dizia respeito a autoavaliação. Nunca quisera falar sobre si mesmo.

Certa vez, caminhando sem rumo, já meio paranoico por não ter o que fazer, viu a porta semiaberta do museu da cidade. Não titubeou. Adentrou e paralisou diante de uma obra neoexpressionista. Sentiu-se diferente, suprassensível, quando viu naquele quadro a figura de uma plebeia. Finalmente distinguira algo significativo lá. Aquele rosto tranquilo, porém sofrido do quadro mudaria sua vida.

De repente ouviu-se um estrondo e um controle semiautomático comandara a porta que às costas dele se fechava. Correu com a força de um super-homem e fez um esforço sobre-humano para sair antes de a porta ser lacrada.

Não se importou com o ocorrido, mas havia algo estranho. “Talvez alguém que trabalhasse na contraespionagem no país o confundira com um espião”. Pobre menino! Apenas um intruso é o que era. Mas um dia se tornaria o arqui-inimigo do rei, um anti-imperialista. Seu nome entraria para a história como o temido, mas ultrarromântico defensor dos oprimidos. Fora cruel quando necessário, e demonstrara sensibilidade nos momentos de dor alheia.

O antissemita, a plebeia, as caçadas e tudo o que passara fizeram com que o menino-homem alçasse voos infindáveis e longas viagens pela autoestrada da vida. Seu nome era Hífen do Trema Circunflexo Agudo.

Rozenice E. Sanches

2 comentários:

  1. Ideia para trabalhar textos com palavras modificadas pela Reforma Ortográfica.
    Distribuir aos alunos várias palavras "novas" (Reforma Ortográfica) e pedir que produzam uma narrativa utilizando tais palavras.
    Maneira de fazê-los se familiarizar com as mesmas.

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  2. Parabéns pela criatividade!!!
    Obrigada pela dica.... já vou cuidar de preparar as palavras...
    Um abraço,
    Helenice Araújo

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