segunda-feira, 10 de agosto de 2009

CAMINHO SUAVE


Tudo o que aquela garotinha queria era ir à escola. Já iria completar 7 anos e seus pais não a matricularam na pré-escola (privilégio de classe alta).

Ela sabia que teria que dividir o material com os 3 irmãos. Teria vergonha quando um deles batesse à porta de sua sala para pedir o lápis de cor, já que uma caixa apenas serviria para a família. Mas ela estava ansiosa demais para deixar esses detalhes abaterem-na.

Foi. Conheceu sua primeira professora. Lúcia. Era a mulher mais linda, mais adorável, mais agradável, mais encantadora do mundo. E seria muito mais que tudo isso porque mostraria à menina os caminhos suaves do be-a-bá.

A garota se esforçava ao máximo para aprender tudo o que a professora ensinava. Conheceu uma historinha que se chamava “Quer ser meu amigo?”. Falava de um garoto que não tinha amigo nenhum, então viu um pássaro numa árvore e ofereceu dinheiro para que o bichinho fosse seu amigo. A ave respondeu que amigo não se compra, se conquista. Ficara encantada, a pequena: “Puxa! Não se compra amizade.”

Mas um dia uma coleguinha da escola disse a ela que não queria mais ser sua amiga porque nunca trazia dinheiro para lanche e a outra concorrente à amizade sempre tinha lanche para dividir. Fora trocada. “Amizade se comprava?”

Depois que aprendeu a ler, ninguém mais aguentava a leitora. Lia placas, folhinhas de comércio espalhadas pelas paredes da casa, em decoração, rótulos sobre a mesa, marcas de carro e até as pequenas listas de compra que sua mãe eventualmente lhe dava para buscar na “venda” da esquina. O dono da venda marcava tudo num caderno brochura grande, com uma letra ininteligível e a estudante pensava: “Como eu poderei saber o que ele está marcando, se não entendo?”, mas os pais nunca reclamavam quando iam pagar a conta. Certamente eles entendiam a letra também.

Então ela aprendeu que a letra “L” pode ter som de “U”. “Uau! Que interessante!”. Viu uma folhinha nova que a mãe trocara na parede e como tudo o que era novo estava para ser descoberto, lá foi ela diante do calendário de propaganda e leu em voz alta para que a mãe ouvisse e soubesse como ela estava boa de leitura: “Comércio Silva “Úteda”.

-- “O quê?” – a mãe perguntou assustada.

--“Úteda, uai.”. A senhora caiu numa gargalhada tão alta que a própria avó podia ouvir na casa ao lado.

A decifradora de palavras não entendia bem o motivo do riso, mas quando a mãe finalmente conseguiu acalmar-se, disse: “Limitada, Comércio Silva Ltda.” E explicou a ela que o “L” só funciona como “U” no meio das palavras.

A pequena pensou: “Sei lá...Depois pergunto para minha professora, porque minha mãe não sabe de nada.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário