Onde dormi enquanto tantos voavam?
O que falei quando tantos me perguntavam?
Que esperanças dei no momento em que tantos desacreditavam?
Que saldo levei na surdina enquanto tantos rezavam?
O que sobrou de mim onde tantos esperavam?
...............................................................................
segunda-feira, 21 de dezembro de 2015
sábado, 12 de dezembro de 2015
DESIGNAÇÕES
Sofremos certa metamorfose com o tempo.
Metamorfose na vida de pessoas.
Passamos a ter outras designações para algumas.
"- Uma ex-aluna será sempre uma ex-aluna? "
Não me recordo o motivo da pergunta,
Mas a resposta foi um "Não" certo.
Realmente: uma ex-aluna pode tornar-se tantas coisas...
Até anjo.
For: Joyce
Metamorfose na vida de pessoas.
Passamos a ter outras designações para algumas.
"- Uma ex-aluna será sempre uma ex-aluna? "
Não me recordo o motivo da pergunta,
Mas a resposta foi um "Não" certo.
Realmente: uma ex-aluna pode tornar-se tantas coisas...
Até anjo.
For: Joyce
QUERUBIM MANCHADO
E justamente naquele dia
O ébrio anjo da guarda
Estava cumprindo seu dever:
E segurou os braços dela.
A queda que deveria ter sido e não foi.
Ei, anjo safado,
Querubim alcoólatra
Agora caminha por aí
Manchado do sangue que não lhe pertence.
Para quem nunca antes conseguiu chegar na hora,
Respeito eterno.
O ébrio anjo da guarda
Estava cumprindo seu dever:
E segurou os braços dela.
A queda que deveria ter sido e não foi.
Ei, anjo safado,
Querubim alcoólatra
Agora caminha por aí
Manchado do sangue que não lhe pertence.
Para quem nunca antes conseguiu chegar na hora,
Respeito eterno.
sábado, 5 de dezembro de 2015
DEVANEIOS
Senti uma luva suave envolvendo meu pescoço.
- "Você parece um anjo."
Os dedos tomaram a forma arredondada das veias pulsantes.
- "Não sou um anjo. Sou a corrente atada à âncora da sua vida."
- "Vida? Qual?"
A luva apertou-se até levar-me ao fundo. E vi.
- "Você parece um anjo."
Os dedos tomaram a forma arredondada das veias pulsantes.
- "Não sou um anjo. Sou a corrente atada à âncora da sua vida."
- "Vida? Qual?"
A luva apertou-se até levar-me ao fundo. E vi.
sexta-feira, 4 de dezembro de 2015
BITUCAS
Procurei pelas bitucas que encontrávamos nas ruas.
Como não se avizinhar dos que as jogaram?
O prazer subversivo da infância, tragar.
A bebida não fazia tanto sucesso entre os pequenos.
Os restos de tabaco sim.
Tudo tão natural.
Os donos antigos das bitucas nunca imaginaram o destino delas.
Pequenas bocas...
Para alguns teria sido a maior rebeldia já cometida,
A outros, a perdição, males, morte.
Mas para uma teria sido o auge da excentricidade,
Acender uma bituca, tragar como se fosse o último prazer...
E naqueles tempos era.
Como não se avizinhar dos que as jogaram?
O prazer subversivo da infância, tragar.
A bebida não fazia tanto sucesso entre os pequenos.
Os restos de tabaco sim.
Tudo tão natural.
Os donos antigos das bitucas nunca imaginaram o destino delas.
Pequenas bocas...
Para alguns teria sido a maior rebeldia já cometida,
A outros, a perdição, males, morte.
Mas para uma teria sido o auge da excentricidade,
Acender uma bituca, tragar como se fosse o último prazer...
E naqueles tempos era.
quinta-feira, 3 de dezembro de 2015
PASSOS DOLORIDOS
E de toda a pancada da vida resta um pouco...
As dores persistentes, os passos não dados.
A perna oriunda do estado islâmico,
Prestes a explodir.
Fez-se membro do terrorismo, esta perna.
Nos últimos dias, põe-me em constante delírio:
A salvação só virá por uma ponto de saída?
Todos os outros serão condenados?
É preciso armar-se e combater os infiéis,
Todos os que não sofrem, mofarão na UTI.
Os que se negarem a fazer a passagem,
Serão condenados a ficar na dúvida eterna,
Ficarão se perguntando para sempre:
"Por que eu não fui?"
As dores persistentes, os passos não dados.
A perna oriunda do estado islâmico,
Prestes a explodir.
Fez-se membro do terrorismo, esta perna.
Nos últimos dias, põe-me em constante delírio:
A salvação só virá por uma ponto de saída?
Todos os outros serão condenados?
É preciso armar-se e combater os infiéis,
Todos os que não sofrem, mofarão na UTI.
Os que se negarem a fazer a passagem,
Serão condenados a ficar na dúvida eterna,
Ficarão se perguntando para sempre:
"Por que eu não fui?"
terça-feira, 24 de novembro de 2015
NÓ CEGO - SUBMUNDO DA HISTÓRIA
Poderia ser um só correndo em meu encalço.
Poderia estar sozinha para decidir o que fazer sozinha...
Fugir seria ótimo!
Gritar que não queria viver aquilo seria perfeito. Desistir.
Mas não. Não pude. Não era só um correndo atrás de mim.
Havia um batalhão de homens fardados, com caras pintadas de guerra
E bem armados.
Correr só de que jeito, se atado a meu braço por uma espécie de algema
Havia alguém que nunca vi antes e que dependia de mim também para se salvar?
- Corre!!! - era o que eu podia gritar, num português maldito - Corra!!! não cabia
naquele matagal e situação. Então consegui me livrar dele e acordei com os tubos
de soro na mão desvairada. Acabara de arrancar a algema que não existia
naquele braço cansado de dor... E consegui dar fim à angústia do meu companheiro
que tinha medo de viver...
Poderia estar sozinha para decidir o que fazer sozinha...
Fugir seria ótimo!
Gritar que não queria viver aquilo seria perfeito. Desistir.
Mas não. Não pude. Não era só um correndo atrás de mim.
Havia um batalhão de homens fardados, com caras pintadas de guerra
E bem armados.
Correr só de que jeito, se atado a meu braço por uma espécie de algema
Havia alguém que nunca vi antes e que dependia de mim também para se salvar?
- Corre!!! - era o que eu podia gritar, num português maldito - Corra!!! não cabia
naquele matagal e situação. Então consegui me livrar dele e acordei com os tubos
de soro na mão desvairada. Acabara de arrancar a algema que não existia
naquele braço cansado de dor... E consegui dar fim à angústia do meu companheiro
que tinha medo de viver...
OPISANIE SUIWATA
“A gente escreve para não esquecer.
Ou para fingir que não esqueceu.
[...] Ou para inventar o que esqueceu.
Talvez a gente só escreva sobre o que nunca existiu.”
VERONICA STIGGER
Ou para fingir que não esqueceu.
[...] Ou para inventar o que esqueceu.
Talvez a gente só escreva sobre o que nunca existiu.”
VERONICA STIGGER
sexta-feira, 20 de novembro de 2015
RECLUSA
E foi tão pouco tempo que se passou cá fora para os outros,
Mas foram incontáveis os dias para meu corpo cansado lá dentro.
Até que não pudemos mais nos situar nas páginas de calendários
E começamos a pensar que alguém estaria cansado da vida.
Entretanto havia algo de pestilento no ar
e de falas desconexas
Mas foram incontáveis os dias para meu corpo cansado lá dentro.
Até que não pudemos mais nos situar nas páginas de calendários
E começamos a pensar que alguém estaria cansado da vida.
Entretanto havia algo de pestilento no ar
e de falas desconexas
dentro daquele lugar sombrio
Blues da Piedade
"Vamos pedir piedade, Senhor, Piedade, para essa gente careta e covarde..." É tudo o que venho pedir. Ah, e falta também coragem... Peço essa coragem aí para meus ossos contritos e fragilizados...
sexta-feira, 16 de outubro de 2015
GUERRA
"- O mal é esta ser a guerra do vocês.
Ninguém a considera sua.
É filha de pai incógnito."
(Personagem Capitão)
NÓ CEGO - CARLOS VALE FERRAZ
Ninguém a considera sua.
É filha de pai incógnito."
(Personagem Capitão)
NÓ CEGO - CARLOS VALE FERRAZ
E a guerra, quem as faz sempre,
quem morre e mata são os que não sabem
o porquê de fazê-lo.
segunda-feira, 12 de outubro de 2015
ESCRAVIDÃO
CARTA DE ANA OLÍMPIA A EÇA DE QUEIROZ - AGOSTO DE 1900.
"Os escravos constituem o fermento da grande sublevação. Em primeiro lugar porque são almas livres, ainda não submetidas a essa ideia monstruosa de um Deus e de um Paraíso com que os governos dos países cristãos iludem os pobres. Em Deus, ou melhor, na ficção de Deus, está a verdadeira escravidão. A liberdade dos homens só será completa quando tivermos assassinado Deus. [...] O problema é que a liberdade total assusta o Homem." NAÇÃO CRIOULA - AGUALUSA
LIBERDADE
Ontem disse-me: "se forem os brancos a oferecer a liberdade aos pretos
nunca mais seremos realmente livres.
Temos de ser nós a conquistar a liberdade
para que possamos depois olhar para vocês
de igual para igual."
Fradique Mendes (sobre Ana Olímpia)
NAÇÃO CRIOULA - AGUALUSA
Provavelmente Ana Olímpia tivesse razão.
segunda-feira, 5 de outubro de 2015
JUSTIÇA
"Aquele que luta contra os agentes da punição faz, de algum modo, a própria defesa individual contra uma ordem jurídica que o não respeita nem o protege." JOAQUIM NABUCO
(NAÇÃO CRIOULA - AGUALUSA)
SOLIDÃO
"Como escreveu o velho Balzac: A solidão é óptima, desde que haja alguém com que possamos conversar sobre isso."
CARTA DE FRADIQUE MENDES
(NAÇÃO CRIOULA - AGUALUSA)
SECRET LOVE
"Escreves: 'O nosso amor nasceu furtivo e até onde eu alcanço teria de continuar assim, criando pouco a pouco sombras e rancor - que é o bolor dos sentimentos -, até por completo apodrecer.' Eu acredito, pelo contrário, que certos sentimentos mais facilmente se corrompem quando expostos à luz pública das praças e das ruas."
CARTA DE FRADIQUE MENDES A ANA OLÍMPIA
(ROMANCE: NAÇÃO CRIOULA - JOSÉ EDUARDO AGUALUSA)
segunda-feira, 21 de setembro de 2015
MORTE ALHEIA
“No fundo, claro, é a nossa própria morte
que tememos na
vivência da alheia
e é em face dela e por ela
que nos tornamos submissamente
cobardes.”
ANTÓNIO LOBO ANTUNES
(Os cus de Judas)
SUBSOLO
"Existem nas recordações de todo homem coisas que ele só revela mesmo aos amigos. Há outras que não revela mesmo aos amigos, mas apenas a si próprio, e assim mesmo em segredo. Mas também há, finalmente, coisas que o homem tem medo de desvendar até a si próprio, e em cada homem honesto, acumula-se um número bastante considerável de coisas no gênero. E acontece até o seguinte: quanto mais honesto é o homem, mais coisas assim ele possui."
MEMÓRIAS DO SUBSOLO - FIÓDOR DOSTOIÉVSKIsegunda-feira, 17 de agosto de 2015
CAPA HUMANA
“O tempo trouxe-nos a sabedoria da incredulidade e do
cinismo [...], e desconfiamos tanto da humanidade como de nós mesmos, por
conhecermos o egoísmo azedo do nosso caráter sob as enganadoras aparências de
um verniz generoso.”
António Lobo Antunes (Romance Os cus de Judas)
António Lobo Antunes (Romance Os cus de Judas)
domingo, 2 de agosto de 2015
PRATA
Ontem namorei a lua de novo.
Imensa e luminosa
Navegou pelo céu
Sob meu olhar atento
Por horas.
Horas vazias
Cinzas horas.
Pelas horas minhas
e pela prata dela.
Horas que anunciam
A música da vida.
Breve vida!
OBSTÁCULOS
Eu havia lido uma frase em um romance contemporâneo de Cristovão Tezza: "A vida é uma corrida de obstáculos." Pensei na possível ambiguidade que não há. Seria uma corrida com obstáculos, daquelas que as pessoas os pulam para chegarem à linha de chegada, ou seria uma corrida na qual se carregam os obstáculos e os vão pondo diante de cada passo dado? Talvez seja essa última a verdadeira interpretação para a frase. Nós, pequenos seres mortais, somos peritos na arte de fazer da nossa vida um problema nem sempre tão complexo quanto aparenta. Muitas vezes passaríamos sem eles, ou os resolveríamos com um simples "não". Será que gostamos de viver criando obstáculos? Seríamos todos, além de vis seres, masoquistas?
CAUSA E CULPA
"Há uma causa e uma culpa em tudo - é preciso que haja, é absolutamente indispensável que haja um sentido para as coisas, ou caímos no abismo. [...] a ideia do acaso é insuportável. [...]" Cristovão Tezza
PÉROLA POÉTICA NO ROMANCE
Nada do que não foi
poderia ter sido.
Não há outro tempo
sobre esse tempo.
Amanhã e amanhã
é uma estrada curva.
Ninguém abre a porta
ainda em modelo.
Hoje ouvimos os ratos
roendo o outro lado.
Ninguém chegou lá,
porque hoje é aqui.
Mas o sonho existe
o sonho transporta
o sonho desenha
uma escada reta.
Quando cortas o pão
o depois-de-amanhã
não te interessa.
Mesmo que sabes:
todas as forças
estão reunidas
para que o dia amanheça.
CRISTOVÃO TEZZA
VERGONHA
“A vergonha é uma das mais poderosas máquinas de
enquadramento social que existem.
O faro para reconhecer a medida da
normalidade,
em cada gesto cotidiano.”
Cristovao Tezza
(Excerto do romance O filho eterno)
domingo, 7 de junho de 2015
quinta-feira, 14 de maio de 2015
AUSÊNCIA - DRUMMOND
Por muito tempo achei que a ausência é falta.
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
E lastimava, ignorante, a falta.
Hoje não a lastimo.
Não há falta na ausência.
A ausência é um estar em mim.
E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,
que rio e danço e invento exclamações alegres,
porque a ausência, essa ausência assimilada,
ninguém a rouba mais de mim.
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE
METAMORFOSE
E foram aqueles olhos famintos de vida
Que me fitaram com pedido de socorro.
Balbucios de "não me deixe morrer".
Foram as noites em claro,
As tentativas frustradas de aliviar a dor
Com suas mãos entre as minhas.
Foram as chegadas, as despedidas,
Foram os poucos dias que passei ao seu lado.
Foi seu desejo de viver
Que me impediu de querer morrer.
Foram os olhos, as poucas palavras,
o corpo franzino, tão pequeno que caberia no meu colo.
Foi sua dor que me mostrou
as tantas dores maiores do que a nossa...
Assim reaprendo a viver.
Que me fitaram com pedido de socorro.
Balbucios de "não me deixe morrer".
Foram as noites em claro,
As tentativas frustradas de aliviar a dor
Com suas mãos entre as minhas.
Foram as chegadas, as despedidas,
Foram os poucos dias que passei ao seu lado.
Foi seu desejo de viver
Que me impediu de querer morrer.
Foram os olhos, as poucas palavras,
o corpo franzino, tão pequeno que caberia no meu colo.
Foi sua dor que me mostrou
as tantas dores maiores do que a nossa...
Assim reaprendo a viver.
domingo, 26 de abril de 2015
SEM ATROPELAR
Tudo azul, tudo na paz.
Outro dia:
Tudo cinza, tudo no caos.
Um dia de cada vez
Porque não podemos atropelar a vida.
Outro dia:
Tudo cinza, tudo no caos.
Um dia de cada vez
Porque não podemos atropelar a vida.
segunda-feira, 20 de abril de 2015
VIDA??? ALÔ, VIDA!!!
- Alô? - digo aflita com não sei quem do outro lado da linha. Ela mesma atende o fone de outrem...
- Mais uma noite de tempestade passou, fia... Mais uma. Estou viva!!! Quase fui, mas passou tudo.
Essa vida é mesmo uma criança. Às vezes quer escapar de nossas mãos, mas de repente volta brincando, trazendo alívio para quem clama por ela. E avisa todo segundo: Viva um dia de cada vez! Viver é ouvir uma música nova a cada instante.
Sua voz tem sido doce melodia aos meus ouvidos, tia amada...
segunda-feira, 13 de abril de 2015
HASTA LA VISTA, GALEANO...
"Assovia o vento dentro de mim.
Estou despido.
Dono de nada,
dono de ninguém,
nem mesmo dono de minhas certezas,
sou minha cara contra o vento,
a contravento,
e sou o vento que bate em minha cara."
EDUARDO GALEANO
Agradecimento eterno...
"Dorme agora... É só o vento lá fora..."
domingo, 12 de abril de 2015
DESOLAÇÃO
Onde há luz, sei a escuridão.
Onde nasce a fé, descrença.
Onde veem força, exaustão.
Onde nascem sonhos, pesadelo.
Onde entendem céu, inferno.
Onde encontram flores, espinho.
Onde surge a esperança, descrédito.
Onde notam o infinito, finitude.
Onde enxergam futuro, presente só.
Em vez de amanhãs, hoje.
Nada mais.
sábado, 4 de abril de 2015
LUZ
"Claro, claridade, coisa tipo manhã, avilo,
não vem depois da escuridão?
A vela pra existir,
chama dela,
num é no escuro?"
ONDJAKI
Mas nem sempre a vela
ilumina a escuridão que nos amedronta.
SEM VENDAS
Bendita seja a minha religião.
Benditos sejam todos os ensinamentos.
Aprendo todos os dias
Que o ser humano é irremediavelmente mortal.
A cada página virada
Sei que somos falhos quase sempre.
Que o homem pode ser muito mau,
Mas também pode ser bom.
Que vive pequenas alegrias,
Mas que é infinitamente triste
Porque de uma forma ou de outra
Vive perdendo.
Perde para a vida, perde para a morte...
Nós, às vezes bichos, às vezes gente.
Literatura: religião.
Não embaça as vistas.
Traz a vida desnuda.
E as moléstias todas tatuadas.
Conhecemos assim,
Para o bem ou para o mal,
O ser humano, um bicho.
Animal errante,
Caminhante de trilhos feito teias.
Sem encantamento.
Bendita seja minha religião.
Que não me promete vida eterna,
Mas conserva a luz nos caminhos escuros.
SEM CORES
O mundo visto em arco-íris
De repente tudo nubla, apaga-se...
Mas resta uma cor... É branca.
Não a cor da paz, mas da cegueira.
A cegueira branca.
Porque precisamos cegar para certas dores.
ABALO
Cada dia findo
Leva um pouco da esperança
Que move o ser humano.
Esperança que a vida nos obriga a ter
Para sobrevivermos ao caos...
Ladrão de esperanças
É o tempo implacável.
Vai minguando
Tudo o que parecia
Ser inabalável no pequeno animal que somos...
sexta-feira, 3 de abril de 2015
domingo, 29 de março de 2015
REMO
"Quem nunca andou no mar
não sabe que a terra fica longe
e que a força do braço
acaba rápido no insistir do remo."
ONDJAKI
QUANTAS MADRUGADAS TEM A NOITE
O TEMPO
"Só que o tempo, avilo -
o tempo nos constrói,
o tempo nos destrói [...]."
ONDJAKI
QUANTAS MADRUGADAS TEM A NOITE
(avilo = amigo, companheiro)
ESTADO "CRISTIÂNICO"
Era
apenas uma criança. Uma menina, como tantas outras, que queria brincar, pular,
subir em árvores, jogar peteca, correr pelos pastos, sentir a liberdade dos
pássaros adonados do céu.
Mas
veio em uma família na qual muitos eram religiosos fanáticos. O Estado Islâmico
ainda não existia. Não havia os ataques terroristas que matavam dezenas. Contudo,
pequenos ataques de insanidade exterminavam a alegria de muitos. Poderíamos
nomear aqueles povos de Estado Cristiânico, fazendo uma rápida analogia.
Tão
antiga quanto a humanidade é a crença de que alguns possuem o elevado poder de
se conectar ao Criador e receber mensagens. Hoje parece ser por meio das redes
sociais, local que os humanos escolheram para fazer seus pedidos a Deus, agradecer
ou se lamuriar... Esperemos que Ele tenha tempo de ler o Facebook.
Quanto à menina, tão cedo passou por uma cena
de pânico familiar horrorosa, proporcionado por um ser “elevadíssimo” na sua
família. Alguém dentre eles se meteu a profeta. Teve uma visão. Melhor seria
ter nascido cego. “Ela vai morrer. Deus virá buscar essa menina.”
Gritos
convulsos, choro de dores interiores nunca antes provadas pela família. Orações
de bom encaminhamento. E a criança chorava sua própria morte. “O que esta lhe
reservaria?”. Olhos de medo. Um pavor que deveria ser proibido na infância.
Fazia-se
mortalha naqueles tempos. Tudo muito rústico. Nada do espetáculo de hoje, em
que se entrega o morto a uma empresa e essa o traz maquiado no caixão. Para os
materializados olhos humanos, bem melhor: ver o morto como o adormecido. O
desejo era de acreditar na profecia de Guimarães Rosa: “A gente não morre. Fica
encantado.”
Mas
não existia encantamento naquela morte prematura, nem na dor de todos, nem na
da criança, nem na do profeta que teve a visão. Era real. Haveria de morrer.
Deus avisou. Sem motivos. O grande Pai não precisa de mote para acionar a
morte.
Entretanto
essa visão não passou de uma demência pela qual todo ser humano fanático corre
o risco de passar algum dia. Nada aconteceu à noite. Todos amanheceram vivos. A
menina, inclusive. E uma outra menina, mais nova. Tudo vivo, mas naquele dia, a
ideia doentia e alienante da religião que a família seguia começou a morrer na
cabeça da criança menor. Essa outra assistiu a tudo. E trouxe flashes daquele
circo de horrores uma vida inteira.
O
tempo parece lento, mas é breve demais. Passa sem que percebamos que o
fanatismo muda de nome e lugar, mas existirá enquanto houver ser humano.
Mais
de trinta anos se passaram e a família novamente se depara com uma situação de
risco daquela criança, que hoje é mulher. A mulher, que na inocente infância
chorou a própria morte, luta mais uma vez contra a maldição. “Não há de ser
nada”, digo. “Nada há de ser. É mais um pesadelo. Algum demente deve ter dito
que ela passaria por esse medo de novo. Vai passar.”
A
profecia doente de tantos anos é a verdade de todo ser humano. Todos passaremos.
Mas agora não.
sábado, 28 de março de 2015
TRAVESSIA
"a vida é uma jangada,
veículo de curta travessia, temporal...
mas: mesmo a jangada afunda."
(QUANTAS MADRUGADAS TEM A NOITE)
ONDJAKI
sexta-feira, 27 de março de 2015
VÁCUO
"Chorei com pena de mim,
assombrada pelo vazio que encontrei na minha alma.
Chorei por não saber onde estava [...]."
Kianda em Barroco Tropical
José Eduardo Agualusa
ESTRELAS
"As noites estão cheias de estrela
e no entanto vê como são escuras.
O brilho das estrelas não ilumina caminho algum."
Personagem Kianda
(Barroco Tropical - Agualusa)
quinta-feira, 26 de março de 2015
VIDAS EM OFF
- Sabe o que é uma lágrima que pinga do seu coração? - Silêncio de séculos.
Ouço o choro convulsivo do outro lado da linha. Silencio também. Finalmente retoma:
- É isso, fia. Uma lágrima que escorre do coração, uma lágrima só. Quente e solitária como cada alma é.
É assim que sentimos a dor quando perdemos, para a morte, a pessoa que mais amamos.
- ................
Ninguém mais conseguiu falar. Telefones off. Vidas em off. Almas também.
Poesia da dor pela voz da minha amada tia Léia, que entende como poucos.
Não tem o fundamental completo, entretanto já leu muito da vida... E da morte.
Ouço o choro convulsivo do outro lado da linha. Silencio também. Finalmente retoma:
- É isso, fia. Uma lágrima que escorre do coração, uma lágrima só. Quente e solitária como cada alma é.
É assim que sentimos a dor quando perdemos, para a morte, a pessoa que mais amamos.
- ................
Ninguém mais conseguiu falar. Telefones off. Vidas em off. Almas também.
Poesia da dor pela voz da minha amada tia Léia, que entende como poucos.
Não tem o fundamental completo, entretanto já leu muito da vida... E da morte.
Assinar:
Postagens (Atom)