quinta-feira, 10 de abril de 2014

Dois punhais - Real e imaginário

"[...] Não quero mal às ficções, amo-as, acredito nelas, acho-as preferíveis às realidades; nem por isso deixo de filosofar sobre o destino das cousas tangíveis em comparação com as imaginárias. Grande sabedoria é inventar um pássaro sem asas, descrevê-lo, fazê-lo ver a todos, e acabar acreditando que não há pássaros com asas...[...]" Machado de Assis em "O Punhal de Martinha" (de 2 de junho de 1878)
Lucrécia matou-se com um punhal? 
Martinha sim, matou com um punhal.
Suicídio e homicídio - questão de prefixos.
E os punhais...?

"[...]Com tudo isso, arrojo de ação, defesa própria, simplicidade de palavra, Martinha não verá o seu punhal no mesmo feixe de armas que os tempos resguardam da ferrugem. O punhal de Carlota Corday, o de Ravaillac, o de Booth, todos esses e ainda outros farão cortejo ao punhal de Lucrécia, luzidos e prontos para a tribuna, para a dissertação, para a palestra. O de Martinha irá rio abaixo do esquecimento, Tais são as cousas deste mundo! Tal é a desigualdade dos destinos!

Se, ao menos, o punhal de Lucrécia tivesse existido, vá; mas tal alma, nem tal ação, nem tal injúria, existiram jamais, é tudo uma pura lenda, que a história meteu nos seus livros. A mentira usurpa assim a coroa da verdade, e o punhal de Martinha, que existiu e existe, não logrará ocupar um lugarzinho ao pé do de Lucrécia, pura ficção.[...]" Machado de Assis

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